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Esclarecimentos necessários

A emissora Rede Globo de TV, com a novela Força do Querer, deu ênfase às orientações sexuais e às realidades sofridas pelos transexuais no Brasil.
Nesta novela, havia uma personagem chamada Ivana, que interpreta a filha de uma família heterossexual conservadora.
Esta família lhe educava com todas as feminilidades possíveis, tentando fazê-la uma princesa, porém, em dado momento, a personagem revela não aguentar mais conviver com o gênero mulher, afirmando que sua orientação sexual é outra, no caso, masculina.
Mesmo sabendo dos preconceitos que iria enfrentar perante sua família e a sociedade, luta para poder viver sua verdadeira orientação sexual, inclusive com alterações dos registros civis para o sexo masculino e cirurgia para retirada das mamas.
Talvez o autor da novela nem tivesse a in- tenção que o tema transexualidade fosse o assunto principal, porém, com tamanho ibope, tornou-se enredo central, maior ainda que o tráfico de drogas do Rio de Janeiro, que é outro assunto polêmico abordado na novela.
Fato é que a novela com o tema transexualidade teve tamanha proporção, que a academia jurídica começou a convidar-me a tratar do assunto, vez que já havia abordado em meu livro sobre a temática, em que defendia e defendo que no Programa de Reabilitação e Habilitação deve ser analisada a orientação sexual do(a) segurado(a) e encaminhá-lo(a) para uma atividade que condiz com sua realidade de gênero, com objetivo de inseri-lo(a) em ambiente de trabalho que fique mais próximo de sua nova identidade para, então, evitar de expor em ofício contrário seu novo porte físico, biológico e estético, bem como em atividade que venha sofrer assédio moral ou até mesmo físico por homofobia, vejamos:

“Podemos incluir mais um item, 6: o reabilitando homoafetivo (gay, transexual etc.), ou seja, para cada um deve ser considerada as atividades em que não gere preconceito…”.(1)

Pelo fato dos legisladores, a doutrina brasileira e internacional ainda não terem discutido amplamente sobre os transexuais e seus reflexos no direito previdenciário, e ser este artigo praticamente inaugural, serão poucas as citações bibliográficas.
Portanto, o que traremos à baila são posicionamentos acadêmicos com objetivo em preservar a dignidade da pessoa humana e o sistema atuarial do plano de previdência ao que o(a) segurado(a) estiver vinculado.

A evolução da sociedade frente ao preconceito e dogmas religiosos
Certa feita, em uma das palestras que proferi sobre “A diversidade sexual e seus reflexos no direito previdenciário”, expus que o sistema normativo deveria ser ampliado para proteger as novas relações sociais, como por exemplo, a proteção das “novas” orientações sexuais.
Após o término da palestra, um sujeito abordou-me e disse que a homossexualidade não era a evolução da sociedade e sim um retrocesso no conceito de família.
Desta forma, se faz necessário elucidar que o artigo é científico e tem como objetivo dou- trinar as novas relações sociais previdenciárias frente à realidade da diversidade sexual.
Aliás, a evolução da sociedade, jamais pode limitar-se a dogmas religiosos, políticos ou outros que sejam tão somente aplicáveis ao seu meio ideológico.
Pois, se assim fosse, a sociedade estaria sendo regulada meramente por dogmas extras às relações sociais e ao direito positivo.
O que regula a sociedade é o direito positivo, ou seja, com normas criadas da evolução das relações sociais e não dos dogmas religiosos internos ou outros dogmas externos a democracia.
Neste sentido, para regular uma sociedade não interessa o que uma ou outra religião tem como dogma, mas sim, a discussão das novas relações sociais nas casas legislativas para, então, lançar ou não norma sobre o tema.
Obviamente, o princípio da liberdade deve ser prestigiado no sentido mais amplo possível e, obviamente, analisado qual a força destas “novas” relações sociais, e quais os impactos ocorrerão na sociedade com a aprovação ou não das normas sobre o assunto.
Em uma sociedade democrática, ao menos o assunto será discutido, seja através de audiências públicas, no parlamento, congressos ou artigos científicos, como este que estou escrevendo.

A diversidade sexual
A diversidade sexual tem a ver com a maneira com a qual a pessoa vivencia e exprime sua sexualidade, que, por sua vez, é constituída pela combinação de fatores biológicos, psicológicos e sociais, que são estruturados da seguinte forma: sexo biológico, orientação sexual e identidade de gênero.
Em 2008, a terminologia LGBT foi concebida a partir da I Conferência Nacional GLBT, promovida pelo Governo Federal em conjunto com milhares de pessoas em conferências estaduais, quando então, a sigla, como a conhecemos na atualidade, passou a identificar os cidadãos por sua orientação sexual, quais sejam: lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais.
A respeito dos gêneros, estes correspondem ao que a pessoa sente internamente, que pode ou não estar relacionado ao sexo com o qual ela ou ele nasceu. Assim, o indivíduo incorpora o senso pessoal que o corpo abrange, por livre es- colha, mudança da aparência ou função corporal por intercessão médica, cirúrgica e outras, ou ainda outros aspectos de gênero, inclusive vestimenta, modo de falar e maneirismos.
Independente do sexo com o qual o indivíduo nasceu, ele tem a percepção de si como sendo do gênero masculino, feminino ou uma mescla dos dois, tal fato se relaciona com seus sentimentos, a maneira de agir, se comportar e interagir, em conformidade com suas características de personalidade ou sua identidade, ou modo como deseja ser reconhecido.
Importante mencionar ainda, que nesta população tem-se o conceito de orientação sexual que é a maneira pela qual o indivíduo se sente atraído afetivamente e/ou sexualmente pelo outro, ou como se relaciona com pessoas de gênero diferente, do mesmo gênero ou de mais de um gênero.
Pois, é cediço que perante a lei somos todos iguais, a carta magna, ao adotar o princípio da dignidade humana como um direito fundamental, promove o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Consequentemente, a população LGBT têm direitos como todos os demais brasileiros, além do que, o gênero que assumir não implicará na redução ou no cumprimento de seus deveres.
Em razão do exposto, este artigo abordará as novas relações sociais frente ao direito previdenciário, uma vez que, dentro do princípio da universalidade, a população LGBT tem a sua garantia constitucional como todo cidadão brasileiro o possui, sendo assim, trata-se o artigo de uma reflexão dos direitos e benefícios diante à diversidade sexual.

Posicionamento do STJ e STF quanto aos transgêneros
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça — STJ decidiu, no dia 09 de maio de 2017(2), pela possibilidade de um transexual alterar o sexo registrado em sua identidade civil, mesmo que não tenha realizado cirurgia de 4275, o tema foi analisado pelo Supremo Tribunal Federal — STF, que discute: 1. a possibilidade de alteração de gênero no assento de registro civil de transexual; 2. a alteração do estado civil mesmo sem a realização de procedimento cirúrgico de redesignação de sexo.
Importante ressaltar que o julgamento será apensado ao Recurso Extraordinário (RE) 670422, com repercussão geral reconhecida.
Os Ministros do STF ouviram as posições dos advogados e adiaram a sessão, que aguarda pauta para julgamento.

Dos benefícios previdenciários e a inclusão dos atores sociais LGBT
A Previdência Social é uma vertente da Seguridade Social, que por sua vez, garante constitucionalmente os princípios da universalidade da cobertura e do atendimento(3), da ordem social e o valor social do trabalho(4).
Destacamos que o direito à Seguridade Social e à Previdência Social são Direitos e Garantias Fundamentais previstos nos arts. 6º(5) e 7º(6) da Constituição Federal, ou seja, um direito de todos.
Neste sentido, todos trabalhadores urbanos ou rurais, independente de sexo, cor, raça, idade, têm direito às prestações previdenciárias.(7)

É sabido que, com a evolução da sociedade, novos atores sociais surgem ou são identifica- dos pelo legislador ou jurisprudência frente às novéis realidades.
Neste sentido, quando há uma nova relação social que ainda não há proteção jurídica, o Direito, por sua vez, através do sistema de normas ou por decisões judiciais, deve ofertar a devida proteção jurídica.
O Direito Previdenciário é uma ciência do Direito Social que busca proteger os desprotegidos socialmente, frente aos futuros riscos e contingências sociais.
Desta forma, com a ampla discussão no Brasil e no mundo sobre o reconhecimento dos direitos dos LGBT, a ciência previdenciária não pode deixar de refletir sobre estas novas relações sociais e seus novéis riscos e contingências advindos com as mudanças dos gêneros.
Neste sentido, iremos analisar quais reflexos os benefícios previdenciários podem sofrer frente às realidades dos transexuais.

Aposentadoria por tempo de contribuição
Existem duas espécies de aposentadorias por tempo de contribuição: a integral e a proporcional.
Para se aposentar por “tempo de contribuição integral”, há a exigência de tempo de contribuição, sendo de 35 anos para homens e 30 anos para as mulheres e não tem limite de idade(8).
Na então aposentadoria proporcional, para o homem, o tempo de serviço exigido é de 30 a 34 anos mais a idade mínima de 53 anos e, para a mulher, de 25 a 29 anos de tempo de serviço mais 48 anos de idade.
Portanto, a lei regula a aposentadoria por tempo de contribuição com exigência de idade e período de contribuição distintos para o sexo feminino e o masculino, não trazendo qualquer especificidade para os transexuais.
Antes de adentrar sobre a aposentadoria destinada ao transexual, se faz necessário res- saltar que o trans pode ou não ter se submetido à operação de transgenitalização.
Portanto, para ser considerado um transexual, não há a necessidade de cirurgia de transgenitalização, basta que tenha efetivado intervenções hormonais e/ou simples cirúrgicas(9) para adequar sua aparência física à sua realidade psíquica.
Diante à nova condição hormonal, a aparência física e a realidade psíquica, sem dúvidas, o seu dia a dia laboral será diferente ao que era, pois será condizente com as novas fragilidades e necessidades de gênero.
Desta forma, qual deveria ser a espécie de aposentadoria do transexual?
A questão é complexa, até porque, conforme decisão anteriormente citada, o STJ entendeu que não pode haver nos registros dos órgãos responsáveis pelo cadastro civil, vestígios do registro civil passado ou que é transexual, ou seja, prevalecerá a identidade atual.
Assim, nos vem a pergunta: o tempo de ser- viço trabalhado será considerado com o gênero anterior ou o atual da pessoa?
Se apagar a memória do registro civil, terá que alterar os dados cadastrais no INSS, modificando a qualificação sexual, assim, sem dúvidas, nascerá a seguinte casuística: A aposentadoria do(a) segurado(a) será com as regras de homem ou mulher?
Para evitar os problemas futuros, levantamos algumas hipóteses e as possíveis soluções.
Em primeira análise, a mulher iria aposentar-se com no mínimo de 25 anos de contribuição, mais a exigência de 48 anos de idade (a aposentadoria proporcional).
Com sua nova realidade sexual (homem), terá um ônus de aguardar no mínimo mais 5 anos, pois o tempo de serviço exigido para aposentadoria proporcional são de 30 anos de contribuição mais 53 anos de idade.
Com análise do caso inverso, o homem ao ter sua qualificação de gênero transformada em feminino, irá trabalhar, no mínimo, 5 anos a menos.
Neste sentido, se prevalecer o direito a intimidade de gênero, na aposentadoria por tempo de contribuição, com o registro civil transformado em masculino teria prejuízo, pois teria que trabalhar por mais 5 anos e o contrário, com o estado civil transformado em feminino, trabalharia 5 anos a menos.
Caso o STF entenda que os órgãos responsáveis pelo cadastro civil possam constar a nomenclatura transexual, a solução seguiria o princípio da razoabilidade e/ou proporcionalidade, ou seja, considerar o tempo de serviço/ contribuição, o estado civil que estava no momento laboral e fazer o cálculo da conversão de tempo de serviço com o atual estado civil, que é a simples regra de três da fórmula matemática.
Considerando o tempo mínimo de 30 anos para mulher e 35 para homem, temos os exemplos:
1º Caso: Sexo masculino que altera para feminino: 10 anos trabalhados como sexo masculino e 15 como sexo feminino.
Aplicando a fórmula matemática da regra de 3:
— 10 anos de trabalho como homem divide por 35 anos (tempo exigido para homem)= 0,2857;
— Ao converter essa proporção pelo tempo mínimo de 30 anos da mulher, temos: 28,57% x 30 = 8,57.

— Tendo 15 anos trabalhados como sexo feminino, deve ser somado por 8,57. 15 + 8,57
= 23,57;
— Como a nova aposentadoria para mulher exige 30 anos de contribuição, restam 6,43 anos, ou seja, 7 meses e 2 anos.

2º Caso: Sexo feminino que altera para masculino: 10 anos trabalhado como sexo feminino e 15 como sexo masculino.
— 10 anos de trabalho como mulher dividido por 30 anos (tempo exigido para mulher)
= 0,3333;
— Ao converter essa proporção pelo tempo mínimo de 35 anos ao homem, temos: 33,33% x 35 = 11,67.
— Tendo 15 anos trabalhados como sexo masculino, deve ser somado por 11,67 = 26,67;
— Como a nova aposentadoria como homem exige 35 anos de contribuição, restam 8,33 anos, ou seja, 8 anos e 4 meses.

Esta seria a mais razoável fórmula para garantir a segurança jurídica do sistema previdenciário, bem como, o momento laboral em que foi exercida a atividade conforme o sexo.

Aposentadoria por idade
Existem duas modalidades de aposentado- ria por idade, a urbana e a rural e ambas exigem 180 contribuições(10), porém, diferenciam as regras para homem e mulher quanto à idade.

Na aposentadoria urbana(11) o homem tem que atingir 65 anos de idade e a mulher 60 anos de idade, na aposentadoria por idade rural(12), 5 anos a menos na idade, ou seja, 60 anos para homem e 55 para mulher.
Seguimos a mesma teoria aplicada no tópico acima, se a memória do registro civil for apagada e não constar mais em nenhum órgão o gênero anterior e prevalecer o atual, o transexual utilizará para sua aposentadoria a idade exigida para a qualificação de gênero modificado.
Caso permaneça a memória do registro civil, a teoria é a mesma, aplicar a regra de três na idade e se aposentar com a idade proporcional da diferença do homem e mulher.
A fórmula seria 60/65 = 1,0833% ou 8,33% e ao contrário 60/65 = 0,9271% ou 92,71%
Caso 1: Mulher com 35 anos de idade que alterou a gênero para homem.

A idade mínima seria de 60 anos, ou seja, 35/60 = 0,5833.
Ao converter para a idade do sexo atual, no caso masculino, na idade de 65 anos, temos: 65 x 0,5833 = 37,92 anos de idade.
Portanto, se fosse mulher, aposentadoria aos 60 anos de idade, ou seja, faltariam 25 anos, como sua sexualidade foi alterada para homem, terá que trabalhar mais 2,92, logo, irá se aposentar somente aos 62,92 anos de idade.
Caso 2: Homem com 35 anos de idade que alterou a sexualidade para mulher.
A idade mínima seria de 65 anos, ou seja, 35/65 = 0,5384.
Ao converter para a idade do sexo atual, no caso masculino, na idade de 60 anos, temos: 60 x 0,5384 = 32,30 anos de idade.
Portanto, se fosse homem, aposentado- ria aos 65 anos de idade, ou seja, faltariam 30 anos, como seu gênero foi alterado para mulher, terá que trabalhar menos 2 anos 8 meses, logo, irá se aposentar somente aos 62,2 anos de idade.

Aposentadoria especial
A aposentadoria especial será devida ao trabalhador(a) que comprovar que na sua atividade laboral havia exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício.(13)
Uma vez o(a) segurado(a) exposto aos agentes agressivos acima citados, dependendo o grau de risco da atividade exercida, poderá se aposentar pelo tempo de serviço de quinze, vinte ou vinte e cinco anos, não havendo a exigência de idade mínima.
Caso o(a) segurado(a) em sua vida laboral não esteve por todo tempo de serviço exposto aos agentes agressivos à saúde, o tempo de ser- viço trabalhado em atividade insalubre poderá ser convertido para tempo de serviço comum.
Considerando que o tempo de serviço especial foi em grau de risco mínimo, o tempo de serviço será de 25 anos, ou seja, o período de atividade insalubre poderá ser convertido para tempo comum com acréscimo de 40% para homens e 20% para mulheres, que seria de acordo com o tempo de contribuição exigido na aposentadoria comum (35 anos para homens e 30 para mulheres).
Portanto, quando houver a conversão do tempo de serviço especial para comum o tempo de serviço especial será calculado diferen- ciado para homem e mulher.
Nesta esteira, seguimos a mesma teoria aplicada acima na aposentadoria por tempo de contribuição, ou seja, caso o transexual tenha exercido atividade especial, deve ser considerado o sexo do qual tenha exercido no período laboral à época.
Supondo que um homem tenha exercido 10 anos em tempo de serviço insalubre, sub- meteu-se à transexualidade e hoje é do gênero feminino, o tempo de serviço será acrescido não com os 40% como teria direito enquanto homem, mas sim com os 20% como mulher, pois sua aposentadoria no momento que atingisse o tempo de serviço seria como mulher e não como homem e se obtivesse a conversão prevista para homem, teria trabalhado 20% a mais que as mulheres.
Pois os multiplicadores para o tempo de serviço exposto com os mesmos agentes agressivos a saúde são diferentes para homens e mulheres, conforme prevê o Decreto n. 3.048/99, em seu art. 70, vejamos:
Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte

tabela: (Redação dada pelo Decreto n. 4.827, de 2003)

Tempo a converter Multiplicadores
Mulher (para 30) Homem (para 35)
De 15 anos 2,00 2,33
De 20 anos 1,50 1,75
De 25 anos 1,20 1,40
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço. (Incluído pelo Decreto n. 4.827, de 2003)
§ 2o As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período.
Para mulher na transexualidade que obtiver o registro civil de homem, seria a mesma premissa, no tempo de serviço que esteve ex- posto a agentes agressivos a saúde, ao invés de ter acréscimo de 20% seria de 40%, pois pela mudança de gênero sua aposentadoria não será como homem.

Pensão por morte
A pensão por morte do Regime Geral da Previdência Social é uma prestação previdenciária destinada aos dependentes elencados no art. 16 da Lei n. 8.213/2001.(14)
A primeira decisão judicial prevendo a possibilidade à concessão de pensão por morte a casais homoafetivos foi proferida pela Juíza Federal Simone Barbisan Fortes, em ação civil pública n. 2000.71.00.009347-0 ajuizada na cidade de Porto Alegre, na 3º Vara Previdenciária, pois entendeu que o companheiro ou a companheira homossexual deveria ser considerado dependente preferencial, dentro do inciso I, art. 16 da Lei de Benefícios n. 8.213/91, determinando tal decisão ao INSS para que passasse a cumprir-se em âmbito nacional.
Hodiernamente, de forma pacificada, é cabível a pensão por morte aos casais homoafetivos, inclusive em âmbito administrativo, em que o INSS reconhece o direito supra.
Com relação à pensão por morte prevista no Regime Próprio de Previdência Social de- penderá das regras do ente que estiver vincula- do (União, Estados e Municípios).
Vamos usar como exemplo a famosa regra da pensão por morte dos militares, em que a filha solteira tinha a possibilidade em receber a pensão por morte do pai.
Seguindo o exemplo, tendo a filha dependente o seu estado civil alterado para homem, perderia o direito da pensão por morte?
Pois se o critério material para concessão da pensão por morte é para filhas, ou seja, do sexo feminino e solteira, comungamos do pensamento que sim, perde o direito da pensão por morte.
Em outro sentido, considerando a reciprocidade da norma, já que defendemos que a filha dependente mulher, que tem o gênero alterado para homem perderia o direito da pensão por morte e o Regime de Previdência dos militares automaticamente resultaria a vantagem por não continuar a pagar o benefício, é razoável que o filho homem, que pela transexualidade obtenha o registro civil como mulher, receba a pensão por morte a partir da data do requerimento no órgão concessor, pois não podemos deixar de lembrar que sua realidade biológica, física e social serão alteradas por hormônios, cirurgia e outros tratamentos que lhe deixarão com as características e fragilidades(15) femininas.

Salário-maternidade
O salário-maternidade é um benefício previdenciário que sempre foi destinado às mulheres que tinham filhos biológicos ou adotavam filhos(16).
Porém, com a evolução da sociedade, homens solteiros começaram a adotar filhos e por este motivo, o legislador ampliou a possibilidade para que recebessem o salário-maternidade(17).
Em que pese o legislador estender o salário-maternidade ao homem, a norma continua limitada para outros atores sociais do sexo masculino.
O exemplo citado é real e foi um de meus clientes, em que sua esposa faleceu no parto. Pelo fato de ser viúvo e o filho ser legítimo, o INSS negou a concessão do salário-maternidade alegando que, por força do art. 71-A, somente teria direito o pai adotante ou o segurado que obtivesse a guarda judicial.
Em que pese o legislador ter ampliado a norma, percebe-se que não foi de forma o suficiente para que todos os homens (independente o estado civil) tivessem direito ao salário-maternidade, seja pela adoção ou filho biológico, como no caso em que a companheira veio a óbito.
Diante à negativa do INSS, foi ajuizada na Justiça uma ação para que o Pai, do caso acima citado, obtivesse o direito ao salário-maternidade, da qual se conseguiu o êxito, afinal pai é pai, independente o estado civil.
Nesta esteira, se faz necessária a ampliação da norma para atender todos atores sociais.
São poucos da comunidade LGBT que têm conhecimento que no salário-maternidade já está pacificado sua concessão para casais homoafetivos.
De fato, somente está pacificado, por força da norma, que a partir de 2013 permitiu que homens, no caso de adoção, teriam direito ao salário-maternidade. Assim, automaticamente, os homens homoafetivos que adotassem uma criança passariam a ter tal direito também.
Mas, por ter a norma limitado os homens a terem direito ao salário-maternidade somente com a adoção, os casais transexuais, como por exemplo, mulher trans que virou homem com união marital com um homem trans que virou mulher terão dificuldade em receber o benefício previdenciário.
Supondo que o casal acima tenha optado em fazer somente a troca do registro civil, mantendo intactas suas genitais, logo, podem reproduzir. Ocorre que quem terá um filho é uma mulher que em seu registro civil é homem.
Neste sentido, caso o legislador não regule em tempo estas novas possibilidades, a justiça terá que julgar este e outros exemplos ligados à diversidade.
Como entendo que o salário-maternidade é destinado à criança, no caso, para sua adaptação com a família, comungo do pensamento que não é um caso de muita complexidade, basta o magistrado julgar desprovido de preconceitos.
Assim, não resta dúvida, que, se o salário-maternidade é para o bem-estar(18) do filho, todos os menores devem ter o mesmo direito previdenciário, independente o gênero sexual dos pais, caso contrário, o princípio da igualdade(19), da dignidade(20) familiar, a maternidade(21), da dignidade da pessoa humana(22) e da universalidade da cobertura e do atendimento(23) esta- riam sendo feridos.

Habilitação e reabilitação profissional
A prestação previdenciária de habilitação e reabilitação profissional é um benefício que habilita ou reabilita o(a) segurado(a) para atividade laboral e social diante de sua aptidão profissional, pessoal, social e psíquica de acordo com o contexto em que vive(24).
Portanto, quando lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros forem encaminhados ao programa de reabilitação e habilitação profissional, devem ter garantido seu direcionamento às hipóteses de tratamento e meio ambiente de trabalho que condizem com a realidade do contexto em que vivem.

Desta forma, a equipe multiprofissional especializada em medicina, serviço social, psicologia, sociologia, fisioterapia, terapia ocupacional e outras afins ao processo de reabilitação e habilitação profissional deve ter a inteligência no sentido de que as atividades terão que atender a realidade de cada reabilitando ou habilitando seja ele(a) hétero, lésbica, gays, bis- sexuais, travestis, transexuais e transgêneros.
Pois o objetivo principal do programa de reabilitação e habilitação profissional previdenciário é de inclusão e não de exclusão do meio ambiente do trabalho, que afinal, fará parte do contexto que vive, logo, obviamente, não poderia ser lançado a uma atividade que sofreria qualquer espécie de assédio moral ou sexual.

Por Hélio Gustavo Alves Advogado, mestre e doutor em direito previdenciário pela PUC/SP, parecerista, conferencista nacional e internacional, Coordenador da pós-graduação em direito e processo previdenciário da Faculdade Damásio e da graduação em direito da cadeira em direito previdenciário da UNIASSELVI-FAMEBLU, Presidente de Honra do Conselho Federal do Instituto dos Advogados Previdenciários — IAPE e autor de obras em direito previdenciário.

(1) ALVES, Hélio Gustavo Alves. Habilitação e Reabilitação
Profissional — Obrigação do Empregador ou da Previdência Social? — Atualizado com a IN n. 77/2015.
2. ed. Editora LTr: São Paulo, Hélio Gustavo Alves.
p. 56.
(2) RE 1.626.739/RS
(3) Constituição Federal — Art. 194. A seguridade social
compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a
assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à
assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos
seguintes objetivos:
I — universalidade da cobertura e do atendimento;
(4) Constituição Federal — Art. 193. A ordem social tem
como base o primado do trabalho, e como objetivo o
bem-estar e a justiça sociais.
(5) Constituição Federal — Art. 6º São direitos sociais a
educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência
aos desamparados, na forma desta Constituição.
(6) Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais,
além de outros que visem à melhoria de sua condição
social:
(…)
XXIV — aposentadoria;
(7) Constituição Federal — Art. 7
(…)
XXX — proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de
sexo, idade, cor ou estado civil;
(8) Decreto n. 3.048/99 — Art. 56. A aposentadoria por
tempo de contribuição será devida ao segurado após
trinta e cinco anos de contribuição, se homem, ou trinta anos, se mulher, observado o disposto no art. 199-A.
(Redação dada pelo Decreto n. 6.042, de 2007).
(9) Cirurgias simples: como retiradas de mamas, inclusão
de próteses, mudança no rosto, ou seja, procedimentos
que não tenha havido a retirada do sexo.
(10) Lei n. 8.213/91 — Art. 25. A concessão das prestações
pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o
disposto no art. 26:
II — aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo
de serviço e aposentadoria especial: 180 contribuições
mensais.
(11) Decreto n. 3.048/99 — Art. 51. A aposentadoria por
idade, uma vez cumprida a carência exigida, será devida ao segurado que completar sessenta e cinco anos
de idade, se homem, ou sessenta, se mulher, reduzidos
esses limites para sessenta e cinquenta e cinco anos de
idade para os trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na
alínea j do inciso V e nos incisos VI e VII do caput do
art. 9º, bem como para os segurados garimpeiros que
trabalhem, comprovadamente, em regime de economia
familiar, conforme definido no § 5º do art. 9º.
(12) Decreto n. 3.048/99 — Art. 51 § 1º Para os efeitos do
disposto no caput, o trabalhador rural deve comprovar
o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício ou, conforme o caso, ao mês
em que cumpriu o requisito etário, por tempo igual ao
número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 8º do art. 9º. (Incluído pelo Decreto n. 6.722, de 2008).
§ 2º Os trabalhadores rurais de que trata o caput que
não atendam ao disposto no § 1º, mas que satisfaçam
essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos, se mulher.
(13) Art. 64. A aposentadoria especial, uma vez cumprida a
carência exigida, será devida ao segurado empregado,
trabalhador avulso e contribuinte individual, este somente quando cooperado filiado à cooperativa de trabalho ou de produção, que tenha trabalhado durante quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. (Redação dada pelo Decreto n. 4.729, de 2003)
(14) Lei n. 8.213/91 — Art. 16. São beneficiários do Regime
Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I — o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho
não emancipado, de qualquer condição, menor de 21
(vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência
intelectual ou mental ou deficiência grave; (Redação
dada pela Lei n. 13.146, de 2015) (Vigência)
II — os pais;
III — o irmão de qualquer condição menor de 21 (vinte
e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, nos termos do
regulamento; (Redação dada pela Lei n. 13.135, de
2015) (Vigência)
(15) Fragilidade não no sentido intelectual, mas sim com
questão físicas
(16) Decreto n. 3.048/99 — Art. 71. O salário-maternidade
é devido à segurada da Previdência Social, durante 120
(cento e vinte) dias, com início no período entre 28
(vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência
deste, observadas as situações e condições previstas na
legislação no que concerne à proteção à maternidade.
(17) Decreto n. 3.048/99 — Art. 71-A. Ao segurado ou segurada da Previdência Social que adotar ou obtiver guarda
judicial para fins de adoção de criança é devido salário-
-maternidade pelo período de 120 (cento e vinte) dias.
(Redação dada pela Lei n. 12.873, de 2013
(18) Constituição Federal de 1988 — Art. 230. A família, a
sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas
idosas, assegurando sua participação na comunidade,
defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-
-lhes o direito à vida.
(19) Constituição Federal de 1988 — Art. 5º Todos são
iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
I — homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
(20) Constituição Federal de 1988 — Art. 227. É dever da
família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,
ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão.
(21) Constituição Federal de 1988 — Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral,
de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
(…)
II — proteção à maternidade, especialmente à gestante;
(22) Constituição Federal de 1988 — Art. 1º A República
Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos:
(…)
III — a dignidade da pessoa humana;
(23) Constituição Federal de 1988 — Art. 194. A seguridade
social compreende um conjunto integrado de ações de
iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
(…)
I — universalidade da cobertura e do atendimento;
(24) Lei n. 8.213/91 — Art. 89. A habilitação e a reabilitação
profissional e social deverão proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho,
e às pessoas portadoras de deficiência, os meios para
a (re)educação e de (re)adaptação profissional e social
indicados para participar do mercado de trabalho e do
contexto em que vive.

Hélio Gustavo Alves

CNPJ 33.260-513/0001-90

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