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Dr. Hélio Gustavo Alves PhD ¹

A chamada quarta Revolução Industrial² modificou a forma de trabalho no mundo, ao inserir um conjunto de tecnologias como inteligência artificial, internet das coisas e neurotecnologia no mundo do trabalho e criar a fusão entre os mundos físico e digital na sociedade atual.

Dessa forma, pesquisadores do Direito do Trabalho e legisladores têm defendido a regulamentação da atividade dos prestadores de serviços das plataformas digitais, afirmando que é uma nova relação de trabalho e que não há legislação para enquadrá-los, estando esses trabalhadores desprotegidos nos aspectos trabalhista, previdenciário e expostos ao risco.

Em alguma medida, os riscos globais relacionados ao mundo das relações de trabalho na era digital, descortinados pela Quarta Revolução Industrial, enfraquecem o Estado porque revelam novas fontes de legitimação dos trabalhadores, por exemplo pelas regulamentações das empresas multinacionais que recrutam trabalhadores por meio de plataformas digitais. Esse é o risco inerente ao histórico conflito capital versus trabalho que se repete nesse cenário digital³.

Mas, neste caso, o que é novo é a plataforma digital, em que traz novel modalidade de operação na contratação de prestação de serviços, porém, com a devida vênia, é preciso discordar que não há legislação para este cenário e de forma simples, apenas enquadrar o prestador de serviço como emprego.

Isso porque, no Brasil existem inúmeras formas de contratação tais como:
1. Contrato por tempo determinado.
2. Contrato por tempo indeterminado.
3. Contrato de trabalho temporário.
4. Contrato de prestação de serviços.
5. Contrato de trabalho autônomo.
6. Contrato de trabalho intermitente.
7. Contrato de trabalho terceirizado.
8. Contrato de trabalho home office.
9. Contrato de trabalho parcial.
11. Contrato de trabalho de estágio, dentre outros.

Se for comparado com outros países, o Brasil é um dos países que mais possui espécies de contratos de trabalho, trazendo enorme insegurança jurídica para as empresas. A reforma trabalhista em momento algum pensou em reduzir as espécies de contratos de trabalho a fim de modernizar as tipificações. São tantos contratos que alguns são muitos parecidos, tão análogos que se confundem e a depender da contratação equivocada, poderá gerar passivos terríveis ao empregador. Em que pese as modalidades de contratos serem antigas nas relações de trabalho, geram insegurança jurídica enorme as partes, tanto que há uma avalanche de ações trabalhista discutindo o contrato de trabalho.

Além dos contratos de trabalho com vínculos empregatícios a luz da CLT, existem os trabalhadores que não são regidos pela legislação trabalhista e que estão elencados como categorias profissionais definidos na Lei 8212/91, em seu artigo 12.

Com relação às plataformas digitais a divergência reside em saber se o contratado é empregado(4) ou autônomo (5).

É cediço que para ser considerado empregado é necessário ser pessoa física, constatar que o trabalho seja de forma contínua, ocorra a subordinação, a pessoalidade, a habitualidade e a onerosidade.

O autônomo, conforme o art. 442-B reza, pode exercer a atividade com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afastando a qualidade de empregado, desde que cumpridas por este, todas as formalidades legais que nada mais é do que estar devidamente inscrito como contribuinte individual com inscrição perante o INSS, à luz do art. 12, inciso V, alínea h, da Lei nº 8.212/91 e na Prefeitura Municipal com inscrição no CCM – Cadastro de Contribuinte Municipal.

Nota-se que o autônomo citado no art. 442-B da CLT nada mais é que um dos atores laborais enquadrados como Contribuinte Individual no art. 12, inciso V, alínea h da Lei nº 8.212/91(6).

Aliás, o termo utilizado pela CLT no art. 442-B como autônomo deveria ter sido revogado na reforma trabalhista e alterado para a nomenclatura Contribuinte Individual, o que diminuiria tais divergências no enquadramento com prestador de serviço, tendo em vista que a legislação previdenciária acima citada, bem define as categorias profissional.

O erro é que, para aceitação deste prestador de serviço, as plataformas digitais não têm exigido a comprovação das formalidades legais, ou seja, a comprovação da inscrição perante o INSS e na Prefeitura Municipal com inscrição no CCM – Cadastro de Contribuinte Municipal, conforme prevê o art. 12, inciso V, alínea h, Lei nº 8.212/91.

Neste pensar, o prestador de serviço não está enquadrado em qualquer relação jurídica contratual do trabalho, seja pela CLT ou como Contribuinte individual, o que é um risco social econômico enorme tanto para a plataforma digital, quanto para o empregado na ocorrência de acidente e a consequente invalidez temporária ou permanente, ou seja, como não é contribuinte da Previdência Social, não receberá qualquer espécie de prestação/benefício previdenciário.

Isto é um limbo? De forma alguma, desde que aplique ao caso a legislação atual previdenciária conexa com a legislação trabalhista. Pois o artigo 12 da Lei nº 8.212/91, combinado com o art. 11 da Lei nº 8.213/91, regulamentado pelo Decreto 3.048/99, no art. 9, estabelece que todos que exercem uma atividade remuneratória são contribuintes “obrigatórios” da Previdência Social.

Neste sentido, todos que exercem uma atividade para plataforma digital, desempenham de forma remuneratória e desta renda, obrigatoriamente, se empregado ou contribuinte individual, a empresa tomadora do serviço, com base nos dispositivos legais previdenciários citados, fazer o recolhimento previdenciário.

Independente ao resultado que chegar a Alta Corte, as empresas terão que recolher de forma retroativa a contribuição previdenciária, sejam considerados empregados ou contribuintes individuais.

Portanto:

Se forem considerados empregados, não resta dúvida que a obrigação da contribuição previdenciária é da empresa.
Quanto ao autônomo/contribuinte individual, nota-se na comunidade jurídica que, de maneira geral, atuam somente no âmbito trabalhista, sem a aplicabilidade transversal com o direito previdenciário. Isto é, não tem conhecimento de quem é a obrigação do recolhimento da contribuição previdenciária.
Quanto ao contribuinte individual que presta serviço a uma empresa tomadora de serviço, esta que é responsável pelo pagamento, é sua a obrigação de fazer o recolhimento previdenciário, conforme prevê o art. 216, inciso I, letra A(7), ou seja, a empresa deverá reter a contribuição previdenciária e efetivar o recolhimento para Previdência Social, bem como fornecer o comprovante(8).
Enquanto que, o contribuinte individual que presta serviço autônomo para si próprio a obrigação do recolhimento previdenciário é sua, como por exemplo um personal de educação física, do seu rendimento para outra pessoa física.

Após a elucidação dos aspectos previdenciários do empregado e do contribuinte individual, resta clarividente que já existe regulamentação para as relações de trabalho que utilizam plataformas digitais, como prestador de serviço para plataformas digitais, considerados contribuintes individuais. Ademais, vale ressaltar esta categoria profissional tem a proteção previdenciária no âmbito de riscos sociais, tais como acidentes, gravidez e outros como a garantia de sua aposentadoria.

Como já dito, são inúmeras plataforma digitais e claro, pode ser que alguma delas, pela espécie de contrato, fique explicito o vínculo empregatício, descaracterizando contrato de trabalhado como “autônomo/contribuinte individual”.

Nesta esteira, cabe a ponderação sobre o custo para a empresa conforme a decisão dos Tribunais:
Se for considerado Contribuinte individual
Se for considerado empregado
As empresas de plataformas digitais terão que recolher:

– A Contribuição Previdenciária de forma retroativa com multa e correção, somente isso e tão somente isso.
As empresas de plataformas digitais terão que recolher:

– A Contribuição Previdenciária
– FGTS
– 13º salário
– Hora extra (caso tenha)
– Férias etc
– Multas e correções

É sabido que no Brasil existem muitas plataformas digitais, mas independentemente de qual for o contrato de prestação de serviço, a natureza jurídica do contrato de trabalho pode ser essencialmente de dois tipos: a de contratualismo ou de contribuinte individual.

Portanto, a relação de trabalho e não deve ser vista como única e de forma genérica, pelo contrário, deve ser ponderada de forma individual, conforme cláusulas do contrato da plataforma jurídica.

Com o contrato em mãos, os Tribunais do Trabalho terão que considerar se os indicadores da plataforma digital para ingressar como prestador de serviço, bem como os algoritmos exigidos para se manter na plataforma ou não, são aqueles que caracterizam os princípios do vínculo empregatício, como a subordinação, a pessoalidade, a habitualidade e a onerosidade.

Nesse contexto, uma maior atenção deve ser conferida para o vínculo de subordinação, pois é o requisito que prevalece na análise dos Tribunais, para a caracterização da relação de emprego.

A subordinação possui problemas que se iniciam em sua própria definição. O conceito de subordinação pode ser dividido em objetivo, quando refere-se à inserção do trabalhador em produção alheia por ausência de domínio de fatores de produção, e em conceito subjetivo, quando refere-se a ordens e disciplina, fundada na ideia de hierarquia(9).

É que na sociedade das plataformas digitais de trabalho o exercício laboral é muito bem desenhado como livre de subordinação por um processo de gamificação (com prêmios, estrelas, punição e competição definida). No entanto, essa estratégia de gestão pode sim ser interpretada juridicamente como a clássica subordinação jurídica. Aí reside o problema central que definirá se o trabalho é relação de emprego ou não.
É inegável que o algoritmo possui capacidade técnica de controle e disciplina sob a estrutura subjetiva do trabalhador, sendo capaz de fazê-lo se sentir subordinado a determinada atividade laborativa por meio de metas, disciplina e ordem hierárquica(10).

Mas há que considerar que os indicadores de controle e disciplina é o mesmo aplicado para um terceiro ou prestador de serviço quando visita uma empresa ou presta serviço em outro ambiente que preza pela segurança da vida do próximo e para evitar uma má prestação. Assim, a empresa plataforma digital, beneficiar o bom prestador de serviço, bem como punir ou excluir o mal prestador de serviço, que é identificado por ser considerado contumaz frente as denúncias realizadas pelo próprio consumidor jamais poderia ter a classificação de subordinação objetiva ou subjetiva.

As regras das plataformas são para aplicação de boas práticas para segurança de todos dos envolvidos e para a excelência na prestação de serviço e se um prestador não cumpre, será punido, inclusive com exclusão enquanto que, o bom prestador se serviço será beneficiado de alguma forma e não para fiscalizar a atividade pura.

Assim, não se deve confundir as cláusulas de contrato da prestação de serviço de boas práticas que obtém benefícios ou punições com subordinação.

A subordinação está para as regras do contrato de prestação se serviço que é padrão para todos e não para prestar contas sobre o dia de trabalho.

Caso o prestador de serviço não aceite as cláusulas, tem a prerrogativa de nem ingressar, procurar outra ou sair quando desejar da plataforma digital, não tem qualquer vínculo de empregabilidade no quesito subordinação.
Concluímos que caso o contrato para com a plataforma digital não evidencie os princípios que caracterize o vínculo empregatício, este prestador se serviço nada mais é do que Autônomo/Contribuinte Individual, conforme prevê a legislação acima citada.

Das plataformas digitais mais próximas de nossa realidade, como de transporte e entregas, encomendas, comidas e bebidas, fato é que:
Os prestadores de serviços, trabalham para mais que uma empresa, ou seja, não há exclusividade, nem a necessidade de habitualidade e exercem suas atividades no horário que desejarem;
A renumeração é conforme seu empenho: Se trabalha ganha, se não trabalha não ganha;
A subordinação ao contrato e não a atividade, é restrita às formalidades de exigência de cada empresa, as regras são tácitas, se o prestador de serviço não concordar tem a liberdade de não se filiar à plataforma digital ou sair quando quiser. Caso opte por permanecer, basta seguir normas de operação da empresa, ou seja, não seria uma subordinação, mas sim um condicionamento sobre as regras mínimas para as boas práticas;
Só exigem a pessoalidade para haver o controle de segurança de quem é o prestador se serviço.

Portanto, nestas plataformas digitais mais usuais, ao realizar uma análise frente à transversalidade entre o Direito do Trabalho e Previdenciário, existe uma maior possibilidade de evidenciar na prática se há uma relação contratual como empregada ou prestadora de serviço autônoma, no caso ser contribuinte individual.

A única observação a fazer é quanto à proteção no meio ambiente do trabalho, o que não é algo simples, pois as Normas Regulamentadoras da segurança do trabalho são omissas quanto a prestadores de serviços.

Assim, se deve observar qual o seguimento da plataforma digital, se é apenas uma indicadora do profissional se oferece uma atividade indicada como transporte de pessoas, de alimentos, bebidas, eletricidade, puntura, dentre outros, que coloque a vida do prestador de serviço ou do consumidor em risco, como a lei é omissa, segue a regra geral, ou seja, fornecer o treinamento.

Quanto ao EPI quando necessário, a empresa tomadora de serviço deve exigir que o prestador de serviço assine um termo eletrônico que usará os EPI´s.

Destaca-se que o consumidor (pessoa física ou jurídica) nada tem a ver com meio ambiente do trabalho, por exemplo, um entregador de produtos, que sofre um acidente de moto e está sem capacete, como responsabilizar o consumidor que presume que o prestador de serviço está usando EPI?

O prestador de serviço somente foi indicado ao consumidor por uma plataforma digital, neste sentido, pela omissão da norma de segurança de trabalho, a empresa digital que tem inteligência para criar uma operação complexa de aplicativo, deve incluir nesta sapiência a energia para digitalmente fornecer treinamentos por vídeos e escrito e coletar a termos a obrigação dele usar EPI conforme a atividade profissional.

Bibliografia

ASSIS, A.; COSTA, J; OLIVEIRA, M. O Direito do trabalho (des)conectado nas plataformas digitais. Revista Teoria Jurídica Contemporânea, v. 4, p. 246-266, 2019.

BECK, U. Risk society. Towards a new modernity. Londres: Sage Publications, 1992.

MACHADO, S. A noção de subordinação jurídica: uma perspectiva reconstrutiva. São Paulo: LTr, 2009.

SCHWAB, Klaus. A quarta revolução industrial. Tradução de Daniel Moreira Miranda. São Paulo: Edipro, 2016.

Lei 8212 e 8213 de 1991.
Decreto-Lei Nº 5.452 de 1943 – Consolidação das Leis do Trabalho
Decreto 3048 de 1999

1 Prof. Dr. Hélio Gustavo Alves PhD. Advogado e parecerista. – Comentarista Nacional e Internacional em Direitos Humanos, Constitucionalismo Global e ESG – Environmental, Social and Governance e Direito Previdenciário. Sócio do escritório Hélio Gustavo Alves – Advogados Associados. Mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP. Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Pós-doutor em Direitos Humanos e Democracia pela IUS – Universidade de Coimbra – Portugal. Coordenador da pós graduação em Direito e Processo Previdenciário do Complexo Jurídico Damásio Educacional. Professor de pós graduação em Direito e Processo Previdenciário em diversas Universidades. Presidente de Honra do Conselho Federal do Instituto dos Advogados Previdenciários – IAPE. Recebeu título de Diploma de Mérito Acadêmico do Centro de Estudos de Direito Europeu por reconhecimento do Conselho de Mestres em Sintra – Portugal 2007. Membro da Academia de Letras de Direito Previdenciário – Cadeira nº 01 Membro da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social – Cadeira nº 02. Membro da Academia Brasileira de Direito – Cadeira nº 12. Escritor de artigos e livros em Direito Previdenciário, Constitucional e Relações sociais.

2 O economista Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial, publicou em 2016 a obra “A quarta Revolução Industrial” como resultado de um encontro realizado em Davos que teve como tema a Quarta Revolução Industrial. A partir da chamada Quarta Revolução Industrial ocorreu a necessária inserção das plataformas digitais na maioria das relações de trabalho. SCHWAB, Klaus. A quarta revolução industrial. Tradução de Daniel Moreira Miranda. São Paulo: Edipro, 2016.

3 O risco social historicamente é protegido por diversos institutos de Direito Previdenciário, em maior ou menor grau, a depender necessariamente da espécie de relação de trabalho. Não há como mencionar a sociedade de risco sem fazer referência ao sociólogo alemão Ulrich Beck que estudou a maneira pela qual a sociedade contemporânea se organiza em resposta ao risco. Beck, U. Risk society. Towards a new modernity. Londres: Sage Publications, 1992.

4 CLT – Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

5 CLT – Art. 442-B. A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3o desta Consolidação.

6 Lei 8213/91 – Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
V – como contribuinte individual:
h) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não;

7 Decreto 3048/99 – Art. 216. A arrecadação e o recolhimento das contribuições e de outras importâncias devidas à seguridade social, observado o que a respeito dispuserem o Instituto Nacional do Seguro Social e a Secretaria da Receita Federal, obedecem às seguintes normas gerais:
I – a empresa é obrigada a:
a) arrecadar a contribuição do segurado empregado, do trabalhador avulso e do contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração; Grifado.

8 Decreto 3048/99, Art.216 – XII – a empresa que remunera contribuinte individual é obrigada a fornecer a este comprovante do pagamento do serviço prestado consignando, além dos valores da remuneração e do desconto feito, o número da inscrição do segurado no Instituto Nacional do Seguro Social;

9 MACHADO, S. A noção de subordinação jurídica: uma perspectiva reconstrutiva. São Paulo: LTr, 2009.

10 ASSIS, A.; COSTA, J; OLIVEIRA, M. O Direito do trabalho (des)conectado nas plataformas digitais. Revista Teoria Jurídica Contemporânea, v. 4, p. 246-266, 2019.

Hélio Gustavo Alves

CNPJ 33.260-513/0001-90

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